O ser humano é, por natureza, simbólico. Estabelece, ao longo dos tempos, ritos que o possibilitem expressar aquilo que escapa à imanência. Desse modo, no desenrolar da história, estabeleceu ritos para marcar os diversos ciclos de sua existência. Nos variados contextos, de cada tempo e lugar, essas celebrações ocorrem com suas características específicas. Contudo, o pano de fundo está na necessidade simbólica do ser humano de estabelecer limites, demarcar novos começos, demonstrando, no mundo exterior, a seu modo, o que carrega no mais profundo de seu interior.
Há poucos dias celebrávamos o início de mais um ano civil. Momento de confraternizar, de fazer um balanço do ano que se finda e estabelecer metas para o que se desponta. Alguns se prenderam às filmagens dos shows pirotécnicos, outros se abraçaram fervorosamente, desejando um ano novo feliz. Apesar de tudo isso, as grandes mudanças e a marca de um novo ciclo nascem no silêncio do nosso interior. O silêncio provoca-nos, pedagogicamente, à mudança, pois nos faz capazes de melhor escutar os clamores do nosso interior e, também, do mundo que nos cerca. No silêncio temos o símbolo da semente que cresce sem fazer alardes. Ele nos educa a percorrermos o caminho de nossa existência, como peregrinos, não como turistas. Esses são marcados pelo comodismo e pela busca de saciar os desejos pessoais, enquanto aqueles dão sentido elevado à vida, comprometendo-se com os passos que dão.
O silêncio da criatura é eco do Silêncio que é origem de tudo. A criatura se silencia como espaço para que a Palavra vinda do Silêncio a fecunde (cf. FORTE, 1995). O Pai permanece no Silêncio como origem misteriosa e recolhida. Esse Deus silencioso é, também, a vocação do mundo, razão da nostalgia cravada na alma humana. Sentimento que move o homem em busca do que é eterno. O silêncio é próprio da condição existencial do ser humano. Sem ele não há espaço para a interioridade, nem mesmo para a relação com os outros. Sua existência permite que tudo exista sem predominar o caos. Ele costura todas as coisas da vida. Quando não existe o silêncio a vida se desenrola em atropelos e no esvaziamento das relações e da interioridade.
A sociedade contemporânea apresenta um panorama que se distancia do silêncio. O barulho configura-se como uma fuga fácil daquilo que posso encontrar em minha interioridade. Muito mais do que enfrentar os monstros, hoje se educa para mascará-los. As muitas bandeiras levantadas, as muitas vozes que vociferam pelas mais diversas causas, por vezes, são estéreis, pois não brotam da escuta atenta, que só se faz por meio do silêncio. Que o ano há pouco iniciado seja marcado pela nossa capacidade de silenciar, para escutarmos com o coração. Somente assim, caminharemos com pés de peregrinos pela história, deixando marcas de esperança pelos caminhos que passarmos.
Equipe Arquidiocese em Missão
Arquidiocese de Montes Claros