Viver menino, morrer poeta

Ternura e fragilidade são ingredientes que compõem o panorama da solenidade da Epifania do Senhor. Diferente de uma teofania composta de elementos extraordinários, apoteóticos, aqui se celebra a manifestação de Deus na pequenez de uma criança indefesa. Ele indica ao ser humano o caminho a ser percorrido para uma existência segundo o amor. Na fragilidade de um menino, o toque terno de Deus que nos dá pessoalidade. Ele manifesta à humanidade a unidade na e para qual ela foi criada.

Ao se pensar a vida espiritual na existência cristã, evoca-se a ideia de caminho espiritual. O trajeto a ser percorrido corresponde a um êxodo, saindo da dimensão da individualidade para uma vida de comunhão, de universalidade, como pessoas. Fugir da condição de fragilidade é uma ação contrária a este percurso espiritual. O ser humano sempre se verá confrontado com sua finitude. A proeminência da morte o amedronta. Somente através da abertura à vida no Espírito é que se faz possível a superação do medo de sua própria natureza e com ela se reconcilia.

Os magos servem de imagem para a peregrinação humana, que ao se encontrar com o Menino-Deus, toma novos rumos (cf. Mt 2,1-12). O mesmo que, anos mais tarde, já adulto, vai afirmar que é preciso ser como criança para alcançar a plenitude do Reino dos céus. Os magos representam a humanidade que, dispersa após o dilúvio, se põe na marcha da unidade a partir de Jesus Cristo. Bento XVI recorda que os magos, além de astrólogos, eram sábios. Eles exprimem o movimento de ir além de si mesmos. Peregrinam em direção àquele que confere um sentido mais elevado à vida. A estrela que lhes serve de guia aponta para quem é, verdadeiramente, a luz das nações. O messias não estava no palácio real, na capital. Foi distante do que corriqueiramente se considera grandioso que encontraram aquele que os atraiu. Bem disse o poeta brasileiro Manoel de Barros: poderoso é aquele que descobre as insignificâncias.

A ternura divina, manifestada naquele frágil menino adorado pelos magos, ensina-nos a acolher nossos avessos e torná-los versos da sublime poesia divina. Essa disposição interior provoca-nos a uma vida na qual a ternura se faz componente ontológico da existência. Uma existência que suplanta a morte física e lança-nos na atemporalidade do coração divino. Deus é o grande poeta que versa nas linhas da criação seu amor incondicional, totalmente aberto e dinâmico. Urge dizer que, só é capaz de ler tais linhas quem ousa viver como peregrino, tendo coração de menino e o olhar sensível de poeta. Como cantou Vander Lee, viver menino, morrer poeta. Quem escolhe progredir nesse caminho aprende, na escola da ternura divina, que grandes coisas acontecem através dos pequenos detalhes.

Equipe Arquidiocese em Missão
Arquidiocese de Montes Claros

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